Edição 133 – 2011
Sustentabilidade no plantio gera boa colheita

Flávio Bosco

Professor Dr. Edgar Gomes F. de Beauclair, do Departamento de Produção Vegetal Planejamento e Produção de cana da Esalq / USP, esclarece que mudas transgênicas e geneticamente modificadas são a mesma coisa, mas as variedades à disposição no mercado não são nem uma nem outra coisa; são híbridos obtidos pelo cruzamento tradicional. Modificação genética é um assunto delicado e controverso ainda mais porque, recentemente, o professor da Unicamp Mostafa Habib divulgou resultados de sua pesquisa que afirma que a transgenia causa impactos à saúde humana. Mas, se esse risco o setor sucroenergético não corre, para escolher o melhor tipo de cana é preciso estudar o solo e planejar seu manejo, entender o clima, as épocas de corte, etc. Uma vez determinada a variedade de cana, a escolha permanece até a reforma do canavial cinco anos, em média. Essa escolha é sempre do produtor.

“O uso de fertilizantes e defensivos também é influenciado pela variedade, mas, como em qualquer cultura, será sempre necessário repor no solo o que foi absorvido, seja química ou organicamente.E existe, hoje, uma tendência à fertilização orgânica, pois os resíduos da industrialização da cana são orgânicos e esses resíduos já formam a maior reciclagem de nutrientes do mundo e o setor tem a maior adubação orgânica em área do mundo”, ressalta o professor Dr. Beauclair. A economia depende de vários fatores, mas de forma geral é econômico e sustentável o uso da adubação orgânica que vem dia a dia ganhando força na agricultura em geral, não apenas no setor sucroenergético . A inoculação de Bactérias e Microorganismos BFN e Micorrizas por exemplo, já é estudada no Brasil.

O controle de pragas “ecologicamente correto” também é uma tendência não somente pelo apelo ecológico, mas também porque é mais barato. Dessa forma, o controle químico torna-se o “último recurso” na agricultura. O controle biológico é uma maneira de trabalhar para que haja um manejo ambiental do ecossistema da lavoura de forma a alcançar o equilíbrio ecológico natural, que mantém as populações de “pragas” abaixo do nível de causar dano econômico. Então, na busca por uma agricultura sustentável, não se pode ficar dependente de fertilizantes ou herbicidas químicos.

E se o ideal de preservar o ambiente para que os inimigos naturais possam trabalhar a favor da agricultura não é possível, pode-se utilizar o controle biológico aplicado, liberando esses inimigos naturais para fazer o controle microbiano aplicado, inserindo no processo bactérias ou fungos. Praticar rotações agrícolas e policultivos também já voltou a ser prática comum. O professor Dr. Beauclair lembra que outra forte tendência na agricultura e para a cana é o Plantio Direto. “Fortemente ligado a ideias ambientalmente corretas e economicamente atrativo dependendo das condições, o Plantio Direto sofre com a falta de equipamentos capazes de romper mais de 20t de palhiço que acontece na cana o que representa mais de dez vezes o dos cereais.

A profundidade de plantio também é cerca de dez vezes maior o que pede conhecimento e equipamento específicos. Isso se torna ainda mais crítico com a expansão canavieira que está ocupando espaços não tradicionais como TO, GO e MS”, explica Beauclair que frisa que sim, há maneiras sustentáveis de colher a cana. E, ao contrário do que se pensa, ser sustentável é ser econômico porque o conceito de sustentabilidade traz embutida a ideia de viabilidade técnico-econômica com respeito ao meio ambiente e responsabilidade social. É ter, no mínimo, o mesmo custo.

A produção brasileira de cana, seja para etanol ou açúcar , segue os procedimentos mais modernos e busca a sustentabilidade em cada ação. Mas ainda assim, há previsão de falta de etanol até 2014 pelo pouco investimento e inexistência de uma política pública realmente capaz de incentivar a aplicação de recursos no setor, ainda que os eventos climáticos potencializassem o estado de abandono dos canaviais. Para o professor Dr. Beauclair, o estabelecimento de cotas como o IAAA fazia ou imposição de taxas seria um erro, pois afastaria o interesse dos investidores num setor que sofre ingerência do Governo. “O capital intelectual no setor é alto, mas insuficiente para apagar da memória as distorções ocorridas durante séculos ou mesmo suprir a carência de talentos”.

 

Impactos
Defensivos agrícolas ainda são chamados de agrotóxicos pela academia. E por grande parte da população. É um mercado bilionário e 70% dele estão nas mãos de seis empresas no mundo quase a mesma porcentagem no Brasil. A revista da Unisinos no369 traz um panorama dos “agrotóxicos” no Brasil: história, registro de produtos, sustentabilidade e até entrevista com o professor Mohamed Ezz El Din Mostafa Habib que assinou, juntamente com outros pesquisadores, um relatório que acusa o herbicida glifosato de provocar anomalias congênitas.

Mas mostra também um panorama do que é possível fazer para evitar ou diminuir efeitos negativos dos químicos na agricultura. No Brasil, o registro de defensivos agrícolas é compartilhado entre Ministério da Agricultura, Anvisa e Ibama: enquanto o primeiro faz a avaliação da eficácia dos produtos, o Ibama faz a avaliação do impacto ambiental e a Anvisa analisa o impacto na saúde humana. Na Anvisa, são exigidos estudos com animais para verificar quais efeitos os produtos podem causar à saúde humana. Quando os três órgãos afirmam que o produto tem condições aceitáveis, é concedido o registro, mas se um deles se manifesta contrário, o produto não pode ser registrado no país.

O que alguns acadêmicos questionam nesses procedimentos é que os estudos são realizados em condições ideais de uso, de temperatura, clima, mas, quando o produto passa a ser utilizado no campo, pode apresentar efeitos muito diferentes, se mostrando mais tóxico ou com efeitos que só aparecem nos seres humanos depois do uso. Outra falha apontada no sistema é que, para os defensivos agrícolas, uma vez que o registro foi concedido, o é para todo o sempre e a única mudança feita ao longo do tempo são as reavaliações toxicológicas, realizadas apenas quando há detecção de estudos que apontam riscos à saúde.

Esses estudos são normalmente de outros países, pois é pequeno o número de pesquisas sobre defensivos agrícolas no Brasil, especialmente estudos sobre exposição de seres humanos. Mas ao fazer uma reavaliação, são utilizadas todas as pesquisas em relação ao produto estudado. O único senão é que essa prática coloca no Governo a responsabilidade de juntar os dados e inverte o princípio da precaução as empresas devem assegurar que seu produto apresenta todas as condições de segurança e não o órgão regulador ter que comprovar que o produto causa danos. Some-se a isso a falta de pessoal no Brasil para realizar esses testes e acompanhamentos.

Apesar dessas falhas, a maioria dos projetos de lei existentes desde 1989 foram para afrouxar a legislação de defensivos e não para torná-la mais rígida ou restritiva. Em 2008 a Anvisa colocou 14 princípios ativos em reavaliação e só concluiu o processo de cinco. É um caminho lento onde cabe à Anvisa juntar provas, publicar notas técnicas, elencar inseguranças, propor consultas públicas, ficar sujeita a pressões políticas e à lentidão da Justiça.Uma reavaliação pode estar pronta do ponto de vista técnico-administrativo e continuar sendo discutida na Justiça.

Das cinco reavaliações, quatro são para o banimento: Triclorfom (todos os registros já foram cancelados); Cyhexatina ( só está sendo comercializada em SP para citros e até 31 de outubro de 2011); Endossulfam (banimento total até julho de 2013 proibição imediata em 18 estados); Metamidofós (tem a retirada programada até dezembro de 2012, com a proibição de fabricação ou formulação em 30 junho de 2011 sendo que a empresa Fersol possui uma antecipação de tutela, que a permite continuar produzindo).

O ingrediente ativo Fosmete teve a reavaliação concluída mantendo-o no mercado mediante a aplicação de medidas restritivas como embalagens hidrossolúveis, redução de culturas, exclusão da aplicação costal, e outras. Todos os anos o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos, coordenado pela Anvisa e integrado pelas vigilâncias dos estados, demonstram a contaminação dos alimentos vendidos nos supermercados. No Programa de 2009, foi detectado um grande número de irregularidades, como uso de defensivos em quantidade superior à permitida, uso de princípios ativos não autorizados para a cultura específica e o mais grave, uso de substâncias proibidas no Brasil.

As falsificações e contrabandos são difíceis de interceptar porque a Anvisa só consegue saber a especificação de produtos registrados. O órgão fiscaliza as fábricas e já aconteceu de 11 em 13 empresas fiscalizadas alterarem as formulações sem a autorização. Essa é a parte que somente os agricultores podem erradicar, exigindo a formulação correta e não comprando de empresas duvidosas. Ainda assim ou até por isso? sempre surgem projetos para tirar a Anvisa desse mercado.


O Brasil é o maior consumidor de defensivos do planeta e, embora ainda permita a utilização de produtos banidos em diversos países, uma onda verde começa a ganhar força não apenas nas mesas, mas também nas empresas comprometidas com a sustentabilidade. Professor Dr. Rubens Nodari da UFSC (UNISINOS no 369) lembra que o uso de defensivos afeta os processos ecológicos do meio ambiente, e, por definição, o defensivo tem a função de inibir ou diminuir o desenvolvimento de seres vivos; o uso dessas substâncias sempre acarretará efeitos colaterais não desejados.

A boa notícia é que as empresas de defensivos agrícolas buscam desenvolver moléculas seletivas que preservam os inimigos naturais das pragas e causam menor impacto no ambiente. Mas, se o ecossistema está desequilibrado para se retirar o agrotóxico, é preciso um projeto de transição para um processo de produção agroecológico. O controle de pragas deve ser constante e utilizar o melhor das tecnologias à disposição, um conjunto de ações biológicas, mecânicas e químicas.

É necessário um plano, recursos do governo e agrônomos com outra visão agrícola. Talvez esteja aí, na transição, a chave para algumas soluções na cultura da cana que viu aumentar pragas e doenças devido ao baixo investimento desde 2008 e a redução dos tratos a crença de que a cultura estava sob controle. Some-se a isso condições climáticas adversas e tem-se a perda de 30 milhões de toneladas de cana por safra, cerca de R$ 4,5 bilhões de prejuízo no faturamento do setor.
 
 
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