O processo é tradicional no Brasil: a produção de etanol resulta na geração de vinhaça com temperatura de cerca de 90º C no sistema de destilação. Todas as plantas brasileiras operam assim. Nunca se usou corrente de água fria no procedimento de fabricação de álcool – até a safra atual. Está entrando em operação, na Usina Bom Retiro, em Capivari/SP, uma planta piloto que prevê a integração de uma tecnologia ao balanço energético da unidade.
O equipamento, um “chiller” (resfriador), proporciona obtenção de água fria a partir do calor da vinhaça. A tecnologia, uma parceria da empresa indiana Thermax com a brasileira Dedini, promete melhorar o rendimento da fermentação e reduzir o consumo interno de energia.
Após a produção de álcool, a vinhaça resultante é aproveitada como fertilizante. Mas, para ser bombeada para o campo através de dutos plásticos ou transportada nos caminhões de fibra, precisa ser resfriada – procedimento que exige consumo de energia.
“Nós identificamos que essa quantidade de energia que está sendo descartada no meio-ambiente poderia ser usada para a geração de uma corrente de água gelada que poderia ser usada para melhorar a eficiência do processo”, afirma o diretor-executivo de Açúcar e Etanol da Dedini, Sérgio Barreira.
Segundo o vice-presidente de operações da Dedini, José Luiz Olivério, o novo conceito de planta sucroalcooleira, que prevê consumo racional de energia para sobra de excedentes comercializáveis, exige relações mais eficientes de trocas de calor. “A usina sempre trabalhou com fluxos de água quente e a otimização energética utilizando altas temperaturas está chegando ao ponto de otimização máxima”, sustenta.
De acordo com Olivério, a introdução de um fluxo de água gelada vai possibilitar um novo salto na evolução energética das usinas e ao mesmo tempo vai proporcionar melhor controle dos processos de fermentação. “A vinhaça que sai quente do sistema de destilação é a fonte de calor ideal para gerar o volume de água fria necessário para o resfriamento da fermentação. Dessa forma, pode-se manter a temperatura da fermentação numa faixa de desempenho ótima para esse processo”, garante.
O resfriamento é realizado por uma substância química presente no “chiller” introduzido no processo, o brometo de lítio, que evapora com o calor da vinhaça. A condensação posterior desse elemento tira calor da água e a esfria.
“Quando se alimenta o ‘chiller’ com a vinhaça, que é a fonte de calor, o brometo de lítio que está lá dentro sofre evaporação. Quando se condensa o brometo, ele tira calor de uma outra fonte que é água que veio do processo. É uma troca indireta”, detalha Barreira.
A vinhaça que sai da coluna de destilação vai sempre passar nesse equipamento e resfriar uma água que está sendo usada em um circuito fechado. A substância é resfriada de 80º C para 60º C. Segundo a Dedini, pela característica física do brometo de lítio de temperatura de evaporação e condensação, a tecnologia consome menos energia no resfriamento da água.
Benefícios para a fermentação
O “chiller” fornece água gelada para resfriar a fermentação, que, entre todas as etapas de produção de etanol, é aquela com a menor eficiência – parâmetro principalmente influenciado pela temperatura. “Se a temperatura do meio aumentar, as levedura é estressada e se perde em rendimento”, diz Barreira.
Segundo a Dedini, experiência em laboratórios mostram que a água gelada ajuda a controlar efetivamente a temperatura da fermentação, reduzir índices de infecção, aumentar o rendimento fermentativo e melhorar eficiência na produção de etanol.
De acordo com a empresa, em laboratório os resultados já se comprovaram. Mas essa aplicação é inédita em usina. No fermentador, nunca ninguém usou esse tipo de tecnologia para manter a temperatura constante na condição ótima de trabalho da levedura.
Em laboratório, o rendimento da fermentação chega a ser entre 1% e 2% superior. “Para quem está trabalhando em 88% a 90% em rendimento, 1% ou 2% que ganha a mais é um número muito grande, porque isso é litro de álcool a mais sem custo. Isso vai direto para o lucro, porque a usina obtém a mais da mesma matéria prima”, argumenta Olivério.
Mas hoje não há certificação dessa possibilidade em escala industrial e comercial, o que será testado com a planta piloto instalada na Usina Bom Retiro. “Com essa unidade, vamos ter exatamente quanto vamos poder garantir. O ponto não é dizer que vai melhorar. Isso nós já sabemos. Mas o cliente quer saber quanto. Para garantir o desempenho, precisamos do teste de campo”, diz Olivério.
Se os resultados forem confirmados no campo, os impactos serão grandes. De acordo com cálculos da Dedini, uma usina que processa dois milhões de toneladas de cana por safra (12 mil toneladas/dia) faz cerca de 180 milhões de litros de álcool no período - 1% a mais representaria 1,8 milhão litros.
“Por tonelada de cana, pode conseguir 1 litro a mais de etanol, o que daria R$ 1 milhão a mais de lucro por ano. Isso sobre o lucro. Às vezes a indústria tem 4% a 5% de lucro do faturamento. Isso representaria 20% a 30% a mais de lucro no resultado final”, calcula Olivério. |