Edição 111 – 2007
Invasão na expansão

Divulgação/BCoutinho

Preparação de solo na unidade Itaporã do Grupo BCoutinho: operação inaugura atividades da usina três anos antes da primeira moagem
Com solos e clima diferentes das circunstâncias das áreas canavieiras tradicionais, novas fronteiras exigem rigor e mudanças nos tratos culturais para controle de plantas daninhas

O Grupo Benedito Coutinho, que já possui duas usinas em operação, iniciou recentemente o projeto de instalação de mais três unidades. A empresa escolheu o município de Itaporã, localizado no interior do Mato Grosso do Sul (a 225 quilômetros de Campo Grande) para a implantação de um dos novos empreendimentos. Há poucos meses, foi iniciado no local o plantio de cana em 200 hectares, que serão ampliados para 1200 ha em 2008. A primeira colheita deve ser realizada em 2010, quando estarão cultivados 14 mil ha – em uma área há muitos anos ocupada por pastagens.

Para evitar infestação de plantas daninhas desde o primeiro corte do novo canavial, as operações preparo do solo inauguraram no ano passado as atividades agrícolas da usina. O processo envolve despraguejamento da área, correção do solo, aplicação de herbicidas, aragem e gradagem. "Como é uma antiga área de pastagem, o procedimento deve ser minucioso. Todo cuidado é pouco para prevenir plantas daninhas", explica o supervisor de assistência técnica da área de tratos culturais do Grupo BCoutinho, Antônio Tácito.

Segundo cálculos da consultoria RMS Assessoria Agrícola, o custo médio de implantação de uma lavoura de cana-de-açúcar nas áreas de expansão é de R$ 3000 a R$ 4000 por hectare. Deste total, a aplicação de herbicidas pode demandar de R$ 200 a R$ 250 por ha – essa é a média gasta pela unidade Itaporã da Usina Eldorado. De acordo com Tácito, se o uso da área não fosse precedido pela criação de gado, o investimento poderia ser de aproximadamente R$ 120/ha.

A comparação entre as três unidades do Grupo Cerradinho também comprova o maior custo. Proprietária há 43 anos de uma usina em Catanduva/SP, considerada região tradicional, a empresa inaugurou no ano passado uma filial no Oeste Paulista, em Potirendaba/SP e investe na construção de um terceiro empreendimento em Chapadão do Céu, tradicional pólo produtor de soja e de algodão do Sudoeste de Goiás – a moagem será iniciada em 2009.

Localizadas em áreas ocupadas por grãos e pastagens, as duas filiais da empresa apresentam custos superiores de aplicação de herbicidas, que aumenta de US$ 5 a 10 dólares por hectare, considerando apenas o valor do produto. "Temos custo de US$ 30 a US$ 35 por ha em cana soca e de US$ 40 a US$ 50 em cana planta", revela o gerente de tratos culturais do Grupo Cerradinho, Eduardo Belucci.

O maior custo é atribuído principalmente às características de solo e clima das novas fronteiras de expansão canavieira. Estimativas da empresa FMC apontam que a área plantada com cana no Brasil cresce entre 600 mil e 700 mil hectares por ano sobretudo em áreas totalmente novas para o cultivo da cultura.

Como exemplificam Itaporã, Potirendaba e Chapadão do Céu, nos últimos três anos a produção canavieira tem migrado para novas áreas, localizadas principalmente no Oeste Paulista, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Sudoeste de Goiás, Sul do Paraná e Triângulo Mineiro. "Todas essas regiões são tradicionalmente agropecuárias ocupadas anteriormente sobretudo por pastagens ou culturas de ciclo anual (milho e soja)", descreve o pesquisador Adhair Ricci Junior, especialista em Tecnologia Agro Industrial do Centro de Tecnologia Canavieira.

Divulgação/BCoutinho

Canavial em nova área de cana pode ser infestado principalmente por plantas daninhas de folhas estreitas

Características das áreas de expansão

A plantação de cana em antigas áreas de pastagem impôs aos produtores nacionais um desafio contra inimigos já conhecidos, mas em locais de controle pouco explorados até 2004. O banco de sementes de plantas daninhas é considerado muito alto em regiões antes aproveitadas para a criação de gado, circunstância em que, ao contrário do cultivo canavieiro, as gramíneas são bem-vindas, usadas como alimentação nutritiva para os animais.

Além da altíssima pressão de sementeiras, o consultor Renato Sanomya, diretor da RMS Assessoria, aponta que a predominância de solos de textura leve (com baixa capacidade de retenção de herbicidas) e o longo período de estiagem após o corte do canavial facilitam o surgimento de plantas invasoras.

Característica própria das áreas de expansão de cana, o maior período de estiagem alcança quase cinco meses, se concentra de meados de abril a setembro – nas regiões tradicionais, principalmente em São Paulo, a fase seca perdura de maio até agosto.

A menor incidência hídrica seco requer planejamento e gerenciamento de controle prévios e diferente dos procedimentos adotados nas zonas canavieiras conhecidas. Como há menor tempo de umidade, as usinas são obrigadas a aumentar as aplicações nas épocas secas apesar dos inconvenientes para os herbicidas funcionarem com baixa umidade no solo.

Nas áreas tradicionais, 85% das aplicações de defensivos são realizadas na época úmida – o restante, 15%, no período seco. Mas, nas novas áreas, as aplicações na fase úmida foram obrigatoriamente reduzidas para 75% contra 25% na etapa seca. Segundo Sanomya, em algumas usinas este índice chega aos 30%. "Se a unidade aguardar as melhores condições de umidade, deixa uma área muito grande para tratar em pouco tempo. Por isso, é obrigada a aumentar a aplicação no seco".

Tácito destaca que nestas condições a aplicação também deve priorizar outros fatores: velocidade do vento abaixo de 15 km/h, umidade do ar acima de 50% e temperatura superior a 30ºC. "Nas áreas de expansão esses dados precisam ser observados com cuidado técnico ainda maior, porque a área é desconhecida, e a eficiência do herbicida pode ser muito menor do que o esperado".

Outro ponto favorável à infestação de plantas daninhas é a dificuldade de fechamento das entrelinhas decorrente dos espaçamentos de 1,50 m, tamanho adotado para facilitar o trânsito das máquinas colhedoras - em operações manuais varia de 1,20 m (solo leve) a 1,40 m (solo pesado). De acordo com Sanomya, o maior espaçamento facilita a presença de insolação e umidade, características favoráveis à germinação das sementes daninhas.

O Grupo Cerradinho já está se preparando para evitar o problema na unidade de Chapadão do Céu, que atingirá 4 milhões de toneladas de cana em 2012, com previsão de colheita 100% mecanizada. "Nessas condições, o cuidado deve ser redobrado. Fazemos bom preparo do solo, um manejo correto para eliminar as sementeiras e planejamos uso de herbicida com residual mais longo", conta Belucci. Sanomya ainda recomenda escolha de variedades apropriadas para a região e equilíbrio da fertilidade do solo.

Com todas essas características, as fronteiras de expansões observam infestações muito altas de folhas estreitas (braquiária, braquiarão, capim colonião e capim colchão), que representam cerca de 90% das plantas daninhas presente nestes locais. Mas também há a incidência de plantagíneas, timbete e várias espécies de corda-de-viola.

Segundo o gerente de cultivos de cana da Basf, Ademar de Geroni Jr, nas áreas de cana crua, os maiores problemas com infestações de folhas estreitas ocorrem principalmente na cana planta e na primeira soca crua - a tendência é redução nas próximas socas, com seleção de folhas largas nestas áreas. Já na colheita de cana queimada, a prática do cultivo revolve o solo e favorece a germinação de plantas daninhas de folhas estreitas, devido ao potencial alto de sementes.

Métodos de controle

Renato Sanomya alerta também que o crescimento acelerado de plantio não tem permitido o manejo adequado desse espectro de plantas daninhas. O consultor reforça a necessidade de controle desde os primeiros tratos culturais, como está sendo realizado na unidade Itaporã da Usina Eldorado.

O sistema adotado anteriormente ao plantio da cana determinará diferentes necessidades de preparação do solo. Nas antigas áreas de pastagem, os especialistas recomendam a utilização de manejos, como dessecação antecipada da área e parcelamento dos herbicidas residuais em pré e pós plantio da cana.

"O ideal seria começar com uma aplicação de glifosato com objetivo de eliminar a pastagem. Durante as operações de gradagens, recomendo a incorporação do herbicida trifluralina. Finalmente, após o plantio da cana e assentamento do solo pelas chuvas, a usina deve aplicar os herbicidas de pós plantio", explica Sanomya.

Segundo Tácito, se a antiga área tiver sido anteriormente ocupada por soja, uma prévia análise do solo pode dispensar as aplicações de glifosato e trifluralina. "Mas em qualquer ocasião o trabalho deve ser feito com muito rigor técnico. Se não fizer trato adequado desde o primeiro ciclo, durante todos os outros cortes a usina vai ter problema de infestação alta", diz.

Mas apenas a preparação adequada do solo não garante completa desinfestação. Segundo os especialistas, o controle de plantas daninhas na cana planta deve ser eficiente, para evitar escapes que poderão produzir sementes e incrementar o banco na soqueira.

Geroni recomenda a opção por produtos que controlam principalmente plantas daninhas de folhas estreitas (gramíneas), presentes em maiores infestações. Mas também preconiza o controle de folhas largas. "Quando as gramíneas são muito bem controladas acabam favorecendo a germinação de folhas largas. Existem opções de misturas de herbicidas para folhas estreitas e largas que podem trazer bons resultados".

Segundo ele, a desinfestação de plantas daninhas com herbicidas residuais aplicados no preparo da área e com largo espectro sobre gramíneas, folhas largas e Cyperaceas (tiririca) também pode ser uma opção capaz de proporcionar canavial mais limpo e com menos pressão de plantas daninhas pós plantio.

Outra recomendação é a possibilidade de aumento da quantidade de aplicações – em algumas ocasiões a usina precisa aplicar herbicida em pré-emergência e até duas vezes em pós-emergência ou catação química. "Na área tradicional, a usina aplica o produto e fica descansada porque a planta daninha não volta mais. Como o banco de sementes é alto nas regiões de pastagens, às vezes é preciso fazer algum repasse", argumenta Tácito.

O aumento de aplicações nem sempre é necessário, depende de onde e como está sendo implantado o canavial, da região, do regime pluviométrico, do tipo de solo, das cultivares, das práticas culturais e do manejo das plantas daninhas.

Mas a escolha e a quantidade correta do herbicida e os manejos realizados adequadamente não garantem 100% do sucesso no controle. Um detalhe que pode parecer simples diante de todos os procedimentos recomendados é capaz de determinar a eficácia da operação: a escolha da tecnologia de aplicação.

De acordo com os especialistas, os bicos dos equipamentos aplicadores devem ter ponta de pulverização de espaçamento no correto, a barra de aplicação do trator precisar estar regulada em uma altura adequada. Bicos e peneiras não podem estar entupidos. É importante também verificar a calibragem dos pulverizadores, para evitar perdas e não ter problemas com custo.

"Não adianta nada usar o melhor herbicida do mercado se não aplicá-lo corretamente. Independente se o produtor estiver usando as últimas tecnologias computadorizadas ou uma simples bomba costal, é preciso usar o equipamento adequadamente. Para controlar as invasoras, o produto tem que chegar ao solo de maneira correta", conclui Ricci.

Divulgação/Grupo Cerradinho
Tecnologia de aplicação é aspecto importante: produto tem que chegar ao solo de maneira correta

CONVITE À INFESTAÇÃO

Algumas características presentes nas novas áreas de expansão favorecem o surgimento de plantas daninhas:
• Crescimento acelerado de plantio não permite bom manejo das plantas daninhas
• Altíssima pressão de sementeiras por serem áreas tradicionais de pastagens
• Espaçamento de 1,50 m visando a colheita mecanizada
• Longo período de estiagem após o corte do canavial


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