Edição 108 – 2007
Inclusão Digital
Termelétrica da Usina Santa Adélia: produção eficiente com apoio da TI. No detalhe, a Usina Interlagos ainda em construção: chão de fábrica contará desde o início com um processo automatizado em larga escala
Com investimentos em Tecnologia da Informação, setor já reduz custos, ganha agilidade e responde rapidamente a mudanças de demanda no mercado – mesmo atrasado em relação a outros setores da economia

Antes mesmo de iniciar a primeira moagem, com início previsto para o próximo mês de abril, a Usina Interlagos já realiza boa parte dos seus serviços de término de projeto e construção com base em um sistema de Tecnologia de Informação (TI), que encurta uma “distância “ de pouco mais de 300 quilômetros– trecho que separa a unidade, localizada em Pereira Barreto, da matriz do Grupo Santa Adélia, instalada em Jaboticabal, ambas no interior paulista.

Para que a empresa obtenha sinergia, utilizando o mesmo pessoal das áreas técnica industrial, agrícola e administrativa, principalmente dos setores de suprimentos e almoxarifado, a nova base corporativa está conectada remotamente à Usina Santa Adélia, de onde os profissionais responsáveis acompanham, executam e dão suporte às atividades realizadas na Interlagos.

A aplicação da Tecnologia da Informação oferece respaldo e facilita o gerenciamento da expansão do Grupo Santa Adélia. Segundo o engenheiro José Carlos Lourenço Mazzoco, gerente de Processos e Novos Projetos do Grupo, quando a empresa tinha porte menor e fazia uma contratação de serviços ou aquisição de ativos para a matriz, era possível, com algumas dificuldades, acompanhar o ciclo do processo desde a emissão das solicitações até a chegada dos equipamentos, passando por verificação do atendimento ao pedido e observação dos pagamentos e processos contábeis e fiscais. “Agora , na Usina Interlagos a mais de 300 quilômetros de distância este acompanhamento pessoalmente é impossível. A unidade remota deve estar totalmente conectada à matriz”, exemplifica.

Para Mazzoco, outro exemplo dos benefícios gerados pela TI é a aplicação de portais colaborativos na gestão do conhecimento para integração de equipes de projeto com equipes de construção e montagem.

Assim como na gestão administrativa com a TI, o Grupo caminha a passos largos para a integração das suas unidades produtivas através da TA – Tecnologia de Automação. O chão de fábrica da Interlagos, a exemplo da matriz, contará desde o início com um processo automatizado em larga escala, através de Controladores Lógicos Programáveis ( PLCs), instrumentos e sensores inteligentes interligados através de redes de campo, Sistemas SCADA – Supervisão, Controle e Aquisição de dados, complementados, num segundo momento, por Sistemas de Aquisição de dados históricos, Sistemas de Execução e Coordenação da produção.

Tais sistemas de TI e TA serão extensivos a todas as áreas produtivas da Usina Interlagos, que deve moer cerca de 1 milhão de toneladas na safra 07/08 – com previsão de dobrar o volume na safra seguinte . “Sem um sistema que nos permita integrar as unidades de produção de cana, com as indústrias e as respectivas termoelétricas, e ainda tomar qualquer decisão onde quer que estejamos, não conseguiremos administrar adequadamente o nosso negócio”, completa Mazzoco.

A base para a justificativa e viabilidade técnica e econômica do projeto da Usina Interlagos foi a experiência bem sucedida dentro da própria matriz da empresa. A cadeia logística de moagem e produção de açúcar e álcool da Usina Santa Adélia está completamente interligada entre si e com a termelétrica da empresa, inaugurada há quatro anos.

Segundo Mazzoco, a estrutura contribuiu para a superação de diversas metas de produção e de açúcar, álcool e de geração de energia da termelétrica, que depende totalmente das anteriores, podendo-se citar cifras tais como os 10% em termos de energia exportada acima dos 40kw/h por tonelada de cana, considerado limite para a tecnologia de processo empregada. “O resultado é conseqüência da oferta e disponibilidade atuais de recursos computacionais”. “Mas antes, e mais importante que isso, é resultado das ações de educação e treinamento de equipes dedicadas e motivadas, que sabem projetar, construir e utilizar os sistemas de TI e TA, cabendo relembrar, que TI e TA são meios e não fins”, ressalva.

Para o gerente do Grupo, a tecnologia em implantação possibilitará a cooperação através da comparação de desempenho operacional entre as duas unidades do Grupo. “Pretendemos utilizar um sistema que, além de olhar o chão de fábrica de forma isolada, vai disponibilizar informações de uma área para a outra dentro de cada unidade e entre elas. O caminho está sendo trilhado”.

Quando o planejamento estratégico do Grupo Santa Adélia estiver concluído, a empresa vai operar em um sistema atualmente comum às atividades de refinarias de petróleo, já mais adaptadas aos desafios do cenário atual da globalização. Neste novo contexto comercial, a competitividade das empresas está relacionada a sua capacidade de captar, absorver e gerenciar as próprias informações. A Tecnologia da Informação apresenta-se, portanto, como instrumento capaz de oferecer agilidade e precisão à administração das empresas.

Um recente estudo coordenado pelos professores Nelson Barrizzelli, da Universidade de São Paulo (USP), e Rubens da Costa Santos, da Fundação Getulio Vargas (FGV) indica que o Brasil está tecnologicamente defasado.

Segundo a pesquisa, que envolveu 668 empresários brasileiros, a baixa evolução na integração de softwares e sistemas expõe o País a perdas anuais de R$ 45 bilhões – volume que soma prejuízos em cinco setores da economia nacional: agronegócio, têxtil, saúde, eletroeletrônico e automobilístico.

De acordo com os pesquisadores, a indústria de alimentos poderia engordar o faturamento anual entre R$ 5,5 bilhões e R$ 12,4 bilhões se estivesse tecnologicamente bem preparada para gerir suas informações. “A velocidade na tomada de decisões é fundamental nos dias de hoje. Pois não existe mais a competição entre empresas, mas entre cadeias. A informação precisa estar disponível na hora e no lugar certos. Mas sem TI isso não é possível”, analisa o professor Alessandro Orelli, docente de Produção Sucroalcooleira e de TI da FATEP/IAT, em Piracicaba (SP).

Interesse recente

As estatísticas – e as caixas registradoras de empresas fornecedoras de softwares e sistemas – demonstram que o setor sucroalcooleiro despertou para realidade nos últimos anos. Assim como o Grupo Santa Adélia, muitas usinas têm aumentado suas aplicações em Tecnologia da Informação.

A necessidade de maior eficiência administrativa está criando uma crescente demanda por sistemas de informação. Embora o uso da informática ainda seja tímido em empresas agrícolas quando comparado a outros setores da economia, os setores cítrico e sucroalcooleiro são os mais avançados no meio rural.

A simpatia e os investimentos das usinas em TI, porém, são frescos. “A busca de tecnologia prioriza tradicionalmente modernização de máquinas industriais, equipamentos agrícolas. O interesse por ferramentas de apoio à gestão e integração de processos é recente no setor, sobretudo porque o setor tinha característica de trabalhar com o mercado regulado, o que o deixou em uma zona de conforto”, explica o diretor da PricewaterhouseCoopers, Antônio Gesteira, especialista em Segurança em TI.

Com o fim do Proálcool, sem o incentivo do governo, as usinas precisaram desenvolver metodologias para sustentar a produção de álcool combustível e do açúcar em um mercado concorrido. Até 12 anos atrás, o comportamento da concorrência era efetivamente desconhecido para o setor sucroalcooleiro.

As usinas se preocupavam em produzir, o governo definia as cotas e o faturamento era garantido. “Mas surgiu a concorrência, o que implica a necessidade de manter preços de produtos competitivos. Para isso, as usinas precisaram criar uma estratégia de redução de custos, já que açúcar e álcool apresentam pouca diferenciação de preços”, comenta o empresário Gilberto Girardi, diretor da fornecedora de sistemas Próxima.

A abertura de mercado e o aumento das exigências dos consumidores redirecionaram o foco das usinas para três pontos chaves: qualidade, custo e rapidez.

O processo de redução de custos e melhor utilização de insumos descobriu na Tecnologia da Informação uma ferramenta aliada.

A TI ajuda a identificar claramente quanto cada processo custa e quais atividades consomem determinados insumos em maiores quantidades. “Hoje uma usina é uma atividade muito mais complexa do que antigamente, quando as empresas do setor conseguiam ser administradas através de planilhas manuais. Muitos aspectos mudaram: a velocidade, o tamanho da usina, novas especialidades diferentes incorporadas. Se não lançar mão de tecnologias, de escritório e industriais, não consegue bons resultados”, argumenta Mazzoco, da Santa Adélia.

Nesse novo contexto comercial que se abre para o setor, as usinas também estão sendo obrigadas a se adaptar a fatores tradicionalmente incomuns ao seu ambiente de trabalho. “Sobre o contexto relacionado ao setor alimentício, o principal fator é referente à qualidade dos processos, que são feitos através da otimização e normatização de procedimentos”, comenta a presidente do GPInfo (Grupo da Tecnologia de Informação das Usinas de Açúcar e Álcool do Paraná), Geisa Gerlin – também responsável pelo Departamento de TI da Destilaria Americana.

De acordo com Orelli, a agregação de novos fatores dificultou a tomada de decisões das usinas. “A quantidade de pagamentos enviados na gestão da empresa sucroalcoleira é um fator crítico na tomada de decisões. Problemas de múltiplas origens como gestão ambiental, gestão socioeconômica dos funcionários, cadeia de suprimentos e gestão da qualidade forçam os administradores a avaliar uma gama enorme de variáveis e decisões que, sem a ajuda da TI, seria impossível tomar”.

Segundo o supervisor de TI da Usina Vale do Ivaí, Antonio José de Paula, as decisões acerca do uso da Tecnologia da Informação para apoiar as usinas tornaram-se progressivamente mais importantes, pois podem ter grande impacto estratégico, em especial no cenário de competição globalizada.

“A operação passa a ser fator de obtenção e de manutenção de vantagens competitivas. Essa maneira de operar exige respostas rápidas, flexibilidade e mix de volume de produção, bem como o atendimento as necessidades especiais dos clientes, que representa importantes fatores de diferenciação”, aponta.

A necessidade de aproveitar a rapidez das respostas prometida pela TI estimulou uma sucessão de investimentos em Tecnologia de Informação. Segundo o professor Fábio Cesar da Silva, Pesquisador Doutor da Embrapa Informática Agropecuária, as empresas sadias investem de 0,5% a 2% do faturamento anualmente em TI. Ao aplicar aproximadamente 1,5% da sua receita em sistemas e softwares, o setor sucroalcooleiro se insere neste universo.

Os investimentos em TI autorizaram as usinas a obter maior volume de matéria-prima por hectare de terra e, principalmente, safras de qualidade superior, com melhores preços no mercado – e a gerenciar suas expansões.

A Usina Vale do Ivaí utiliza a TI para administrar seu planejamento estratégico de crescimento. A empresa, que processou 1,561 milhão de toneladas de cana no ano passado, pretende aumentar esse volume para 1,750 milhão de toneladas em 2007, até alcançar 2,1 milhões de toneladas, volume que estima produzir em 2008.

Considerada fundamental para a gestão da Usina, a TI se incorporou de forma significativa e estratégica na empresa, segundo Antônio de Paula. “Para uma empresa que busca um crescimento sustentável, é de suma importância o domínio da informação e conhecimento do seu processo. A TI ajuda oferecendo e buscando tecnologia de gestão e otimização, avaliando e interpretando as tendências de mercado”.

Gestão de custos

Grande parte dos resultados obtidos pela Vale do Ivaí também pode ser atribuída ao eficiente funcionamento de sistemas de ERP (Enterprise Resource Planning), usados como ferramenta de gestão administrativa da empresa. É sobre este tipo de software que incidiram os primeiros investimentos em TI a partir do setor sucroalcooleiro.

Embora não seja regra, geralmente as empresas começam a automatizar as atividades administrativas e financeiras. Até o passado recente, as usinas não estavam muito preocupadas em conhecer seus custos, porque trabalhavam com margens garantidas. “Os cálculos eram feitos manualmente e somente os valores do dia, média e dados eram avaliados e não uma seqüência de dados no tempo como seria o ideal”, reitera o pesquisador da Embrapa, Fábio Cesar.

Atualmente o cálculo de custos com base em anotações manuscritas rivaliza com crescimento. O controle “manual” em planilhas não apresenta dados fiéis da situação da empresa. Nestas circunstâncias, o risco de falhas e erros é muito grande, com impactos negativos para empresa em retrabalhos e descrédito.

Poucas usinas hoje não contam com um ERP de mercado – muitas unidades fizeram investimento maciço pelo menos nessa área nos últimos cinco anos.“Façamos o seguinte questionamento: como posso saber de quanto é o meu lucro se não sei quanto gasto. Para ajudar a conhecer estes números, a TI possui recursos para ajudar”, recomenda Antônio de Paula, da Vale do Ivaí.

Segundo Fábio César, o volume de informações é muito grande e não se admite mais que esses dados só sirvam para explicar fatos ocorridos. A informação, aconselha o pesquisador, deve ser matéria-prima para a usina conhecer pró ativamente a correta condição de todo o processo de produção em tempo real.

Os ERPs foram desenvolvidos para agregar, em um só sistema integrado, funcionalidades que suportam as atividades dos diversos processos de negócio das empresas. “A TI dá uma visualização exata sobre os custos da empresa, que passa a ter uma clareza em relação ao comportamento da operação e dos custos decorrentes”, assegura Girardi.

Mas o mercado sucroalcooleiro começa a exigir uma evolução dos ERPs: a informação geográfica. À medida que expandem seus negócios, por meio da instalação de novas unidades em locais distantes da matriz – como acontece com o Grupo Santa Adélia -, as empresas anseiam por integração. Nesse caso, softwares de gestão corporativa se tornam importantes demandas no mercado.

Na prática, sem um gerenciamento centralizado não há possibilidade de otimização dos recursos. A tendência é que todos os Grupos proprietários de mais de uma usina migrem para este modelo de gestão. “Os grandes ERPs estão sendo implantados no setor”, observa o professor de TI Alessandro Orelli.

A Santa Adélia possui um sistema próprio de gestão empresarial, que vem sendo incrementado para integrar todas suas as operações. O sistema não possibilita integração total da planta, ainda depende da intervenção de algumas pessoas. O Grupo desenvolve agora uma evolução desse software, demandada pela necessidade de integração à Usina Interlagos. “Estamos repensando e executando o modelo para adaptá-lo à realidade de mais uma unidade geograficamente separada”, anuncia Mazzoco.

Para Girardi, da Próxima, não seria exagerado conferir à TI parte da velocidade com que novas unidades estão sendo criadas - e outras compradas por grandes Grupos. A agilidade está apoiada na facilidade que a Tecnologia da Informação provê às usinas a partir de grandes estruturas centralizadas.

Atualmente uma estrutura de TI centralizada, com um grande centro de serviços compartilhados, permite que a criação de uma nova unidade, remota geograficamente, ou a compra de uma nova usina, se restrinja ao empresário ter na localidade fisicamente apenas a produção. “O Grupo reserva para a unidade central, que já está pronta, madura e preparada, toda a parte de processamento da produção”, resume Girardi. “A nova unidade em 30 dias já estará incorporada ao sistema de gestão da empresa. É praticamente desligar o que tinha antes na unidade e no dia seguinte ligar o novo sistema”, completa.

Evolução imatura

Também são gradativamente mais pretendidos pelo mercado sucroalcooleiro softwares para controle e gerenciamento de plantio e colheita, além de sistemas que oferecem soluções logísticas na área agrícola da produção.

Especialistas garantem, porém, que o processo de evolução em TI ainda pode amadurecer bastante. Enquanto algumas usinas operam com sistemas semelhantes aos usados por muitas empresas altamente competitivas, que têm rastreabilidade total do negócio, ainda existem unidades industriais onde não foi instalado sequer um sistema de automação – todo o controle é realizado por anotações.

Essas empresas mantêm um acúmulo de funções sobre um gerente de tecnologia, que se transforma em um “faz tudo”. É a pessoa que programa, interfere na infra-estrutura, dá suporte ao usuário. Este tipo de procedimento é comum em unidades menores, onde a administração ainda não enxerga os benefícios da tecnologia.

A história – e o mercado globalizado – sugerem que o atraso tecnológico pode ser corrosivo para o aproveitamento de todas as oportunidades projetadas para o setor. Nos próximos seis anos, o Brasil vai aumentar a produção de etanol em 20 milhões de litros – na safra 06/07 foram fabricados 17,5 bilhões de litros. Parte do volume total (7 bilhões de litros) irá atender a demanda externa, e o restante (28 bilhões de litros) vai ser consumido no mercado doméstico.

Para suportar o aumento superlativo de produção, o setor sucroalcooleiro nacional investirá, segunda a Unica, US$ 14 bilhões. Aportes tão altos não toleram erros em tomadas de decisões – uma falha, além de provocar prejuízos, pode até inviabilizar o negócio.

A TI pode ser um fator determinante para auxiliar estas decisões. “Além de fornecer informações básicas, permite que se criem cenários com os dados atuais e com as mudanças propostas, o que possibilita um maior embasamento para a tomada de decisão com redução dos riscos envolvidos”, analisa o responsável pelo departamento de TI da Usina Cofercatu, Marcelo Furlanetto Rodini.

A disputa por essas promissoras fatias do bolo (o mercado) será vencida, portanto, por aqueles que estiverem tecnologicamente preparados. “A empresa que não estiver modernizada vai ser engolida pelas concorrentes”, decreta Mazzoco.

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